domingo, 18 de fevereiro de 2007

E tem o Zé. Que imita o mundo que vê. Que vive no mundo que acha que existe. Mas existe, porque ele vê. Então, ‘porque o essencial é invisível aos olhos?’ Então, responde, porque não me canso de ver o Zé, que acredita poder mudar o mundo que nem ele, nem eu, nem você e ninguém vê?

Cadê o Zé?

Sumiu no seu mundo cercado de crianças vestidas de sol. Zé acredita no sol – e nas crianças – e na lua e na lagartixa e no coqueiro imaginário plantado no centro da ilha perdida do paraíso que não há. Zé só não acredita em homens e mulheres grandes. Em crianças sim. Pois ele consegue ver as crianças – e o sol e a lua e a lagartixa e o coqueiro. Mas não o homem. Tampouco a mulher. No lugar das gentes grandes, Zé desenxerga. E sente um furo em qualquer parte que pulsa que lhe faz sentir pena da vida dessas gentes que não vêem o mundo através do buraco do olho da criança: essas gentes que acreditam no relógio – embora nunca tenham visto a hora passar – e não sentem o prazer da brisa invisível batendo em seus corpos de plástico às seis da tarde depois de um dia visivelmente (?) chato. Essas gentes que não se lambuzam de sorvete e essas gentes que nem tomam sorvete. Essas gentes que vêem o dia com olhos de ressaca e à noite correm para casa para descansar.

Descansar.

Do mundo que vêem, da falta de ar, do mundo em que vivem, do mundo que morde e arranca das coisas e das gentes a pureza do mundo de Zé. Mundo que existe. Eu sei, porque ele vê. E eu sinto, sem poder.


Valéria Prochnow



Imagem: Señor,

By Jan Bauman.

2 comentários:

bruni... disse...

obrigado pelo comentário...
muito gentil você!
vou ler com mais calma seu blog...
enfim, seguindo post só posso desejar "bom dia"... afinal, Drummond manda... rs
até mais...

Anônimo disse...

gostei muito do texto. forte e delicado. expressivo demais! parabéns a vc e ao blog. quem escolhe os textos?
um abraço!