domingo, 5 de dezembro de 2010

As coisas circenses


Uma pequena pausa. A hora quarta já está pelo fio de five minutes. Inverno de agosto. O céu de brigadeiro. Azulzíssimo com raios de inversão térmica.
Pondero sobre aquela coisa circense de irmã mais velha. O telefone já tinha tocado, já tínhamos conversado e quando reli uma petit carta, quase pouco petit antiga, vi toda a cena. Um vestido florido de botões miúdos. Solto. Um cabelo já como manda as regras a partir dos quarenta, bem curto. Embora odeie cabelos curtos e adore as saias.
E um portão de ferro, batido e velho, claro como ou mais que a irmã.
Uma conversa pequena. Um café antes de sair. Lembranças de uma carona pairando sobre a cena. Reticências.
Talvez mini flashbacks, que lembram biscoitos água e sal temperados. Não te parece?
Agora vem o circo. E as coisas ensaiadas: um último conselho entre aquelas coisas de parte, não parte. Um recado tardio lançado com a mão levemente. E uma última pergunta sobre aquele amigo que faltou nas conversas lá de dentro.
Mas a hora chega - mais uma olhada e uma saída com uma frase estalada para fazer rir. Já de costas, a cabeça balança um pensamentozinho bom.
O portão range que range e mais uma graciosidade vem para se despedir:
- Cê vai ao circo???

E lá de longe a resposta irônica e desejada:
- Sempre!

A lona cai. Os deveres de dentro chamam. Os passos atravessam a rua estendida.
Outros circos virão: trapezistas, elefantes, zebras. Quando muito, cães amestrados e nós, irmãos, às vezes de mágicos, às vezes de palhaços.


Texto: Ana Guerra.
Imagem:
Sandy Kim