sábado, 24 de fevereiro de 2007

Alice do centro

Alice vivia pelo centro da cidade. Adorava as histórias alheias dentro dos ônibus, nas avenidas movimentadas. Mas o lugar onde ouvia as melhores era sem dúvida na Praça Sete, onde se aglomeram velhos cheios de causos.
Gostava de ficar parada ao lado do Café Nice, ponto predileto daquelas cabeças branquinhas. Onde se toma um café forte, se come um pão de queijo fresco e se saboreiam os boatos mais quentes da cidade.
Em um desses passeios, Alice conheceu Seu Guimarães. Sujeito franzino, lá pelos seus setenta e tantos, que viu Belo Horizonte crescer. Para ele, a cidade nem tem mais os horizontes de quando se mudou do Rio de Janeiro para tratar de suas complicações respiratórias. Assim como fez Noel Rosa, tentando tomar juízo logo que se casou. Belo Horizonte tinha um clima bom, a cidade perfeita para os que tinham doenças nos pulmões.
Todos os dias, Seu Guimarães acorda cedo. Compra o jornal e vai direto para a praça encontrar os velhos camaradas para um café, um jogo de dama, um devaneio aposentado. Nesse dia, em particular, ele descumpriu a rotina. Foi direto para o café. Não havia jantado e a fome amanhecera antes dele.
Com o café em punho e três pães de queijo já sendo digeridos, os dois começaram a conversar. Alice não importava se os casos que ouvia eram verídicos ou não. Queria apenas escutá-los. Saber dos desfechos. Moça boa, criada nas Gerais, gostava de dar atenção a todos.

- Mas, me diga, Seu Guimarães: o senhor mora aqui desde os 17 anos e nunca perdeu o sotaque?

- Evidente que não, minha filha. Meu saudoso pai, que Deus o tenha, sempre dizia que não podemos perder nossas origens. E é assim que carrego as minhas. Na lábia e no samba.

- Então é verdade que ensinou muita gente a sambar...

- Pois é, minha jovem, muita gente. Inclusive a Furacão.

- Furacão?

- Sim. Ela mesma – Hilda Furacão. Aprendi a sambar ainda pequeno. Meu pai me ensinou na época em que o samba era coisa só do morro. Ainda não havia conquistado o asfalto.

- ...

- Pois bem, minha filha. Conheci Hilda aqui mesmo, no centro da cidade. Ela nem era tão bonita assim. Mas o charme era de cegar. Muitos homens ofereceram seus olhos por uma noite com aquele Furacão. Mas, como aconteceu com a maioria, ela nunca me deu bola.

- Então, como é que o senhor ensinou a moça a sambar, se ela não lhe dava atenção?

- Calma, minha filha. Vocês jovens têm a aflição de pássaro preso numa gaiolinha. Chegaremos lá.

Continuaram a conversa com amenidade suficiente para iluminar o lugar onde estavam. Sem poupar os menores detalhes, o velho patinhava na conversa, não chegava ao final. A moça, perdendo a paciência e açulando a curiosidade, não agüentou:

- Pôxa, seu Guimarães, o senhor não passa de um desses contadores de histórias. Que papo mais comprido...

Mas, impávido e solene, Seu Guimarães rebateu, na hora:
- Mas, Alice, eu já disse que não sou mitômano!

Diante daquela estranha e inédita palavra, que fugia a galope do seu vocabulário, Alice continuou a escutar as infindas histórias sem mais interrompê-lo.
Acabou até, talvez em memória da Furacão, aprendendo uns passinhos de samba. Tornou-se amiga do Seu Guimarães e até pensou em escrever um pequeno livro de causos. O nome do livro? Claro, seria “Seu Guimarães, o Mitômano”.
Para Alice, aprender uma palavra nova é um gozo. Usá-la, então...



Daniel Rubens Prado,
Verão de 2007.



Imagem: Café,
by Karin Momberg.

domingo, 18 de fevereiro de 2007

E tem o Zé. Que imita o mundo que vê. Que vive no mundo que acha que existe. Mas existe, porque ele vê. Então, ‘porque o essencial é invisível aos olhos?’ Então, responde, porque não me canso de ver o Zé, que acredita poder mudar o mundo que nem ele, nem eu, nem você e ninguém vê?

Cadê o Zé?

Sumiu no seu mundo cercado de crianças vestidas de sol. Zé acredita no sol – e nas crianças – e na lua e na lagartixa e no coqueiro imaginário plantado no centro da ilha perdida do paraíso que não há. Zé só não acredita em homens e mulheres grandes. Em crianças sim. Pois ele consegue ver as crianças – e o sol e a lua e a lagartixa e o coqueiro. Mas não o homem. Tampouco a mulher. No lugar das gentes grandes, Zé desenxerga. E sente um furo em qualquer parte que pulsa que lhe faz sentir pena da vida dessas gentes que não vêem o mundo através do buraco do olho da criança: essas gentes que acreditam no relógio – embora nunca tenham visto a hora passar – e não sentem o prazer da brisa invisível batendo em seus corpos de plástico às seis da tarde depois de um dia visivelmente (?) chato. Essas gentes que não se lambuzam de sorvete e essas gentes que nem tomam sorvete. Essas gentes que vêem o dia com olhos de ressaca e à noite correm para casa para descansar.

Descansar.

Do mundo que vêem, da falta de ar, do mundo em que vivem, do mundo que morde e arranca das coisas e das gentes a pureza do mundo de Zé. Mundo que existe. Eu sei, porque ele vê. E eu sinto, sem poder.


Valéria Prochnow



Imagem: Señor,

By Jan Bauman.

quinta-feira, 15 de fevereiro de 2007


A mulher mais bonita do centro da cidade


Quem a viu, sorriu. A face perfeita da mulher, eleita, por mim, a mais bonita do centro da minha cidade. Todos pararam para vê-la passar. Não tinha apenas os traços faciais lindos. Tinha também um bumbum arrebitado. Nem grande, nem pequeno. Suas nádegas balançavam ao ritmo de seus passos. Usava roupas discretas, mas mesmo assim era difícil disfarçar a preciosidade de cada curva de seu corpo. Do joelho para baixo, pernas lisas e morenas. O que me deixava a imaginar o resto. Seios redondos, firmes, daqueles que clamam a palma da mão. Uma formosura de mulher. E, além de tudo, cheirava a jasmim.

E não era apenas sua fisionomia. Seus movimentos denunciavam uma alma honesta e delicada. Impossível não ter a voz mais suave deste mundo. Com tantas qualidades, por que não mais uma?

A moça nem ao menos olhava para os lados. Ia em frente, sem se dispersar do trajeto proposto. Alguns assobios de longe. Inevitáveis. Trata-se do centro da minha cidade e galanteios de fazer passarinho chorar são coisas constantes.
Os olhos meio puxados traziam algo indígena. Talvez, filha de pai peruano e mãe brasileira. Com certeza, brasileira – não caminhava, gingava! E os olhos com que os homens, pobres homens, a olhavam, eram cheios de fome, sede e desejo. Inclusive os meus, desvairados.

Naquela tarde no centro da cidade, sorri. Houve um sossego momentâneo quando vi a mulher mais bonita distribuir encantos aos homens e nem perceber toda a pressa desnecessária se esvair.

A mulher passou.

Dobrou a esquina, sumiu. Mas o encanto, não.

Os homens do centro da minha cidade voltaram aos seus afazeres, com a lembrança e a leveza da mulher morena. E a esperança de outras aparições.


Daniel Rubens Prado,
Verão de 2007.
Sol forte e muito refresco.
Imagem: Life in the big City Nairobi,
by George Thiaru.

quarta-feira, 14 de fevereiro de 2007


Mais um adeus


A notícia de mais um adeus chegou à minha caixa eletrônica aproximadamente às 4h30min da tarde. As palavras da moça que gosta do bairro Santa Teresa e curte samba e poesia culminaram em um “Fica com Deus e seja muito feliz”. Palavras duras até para um suposto poeta que as recebe em uma tarde nublada de terça-feira.

Poeta este que escreve agora, tentando entender essa temida hora em que tudo se torna história. A curiosidade levou o homem a tentar desvendar mundos, todos de uma só vez. Outros chamariam isso de descuido, talvez. Mas em meio à vida, dita rápida e passageira, este poeta juntou papéis e canetas e foi ao mundo. Observou olhos e olhares. Sentiu toques e experimentou bocas. Compenetrou-se na verdade e procurou não omitir os passos de seu caminho, nem mesmo a paisagem ao seu redor. Tentou não espalhar sofrimento. Teve certa leveza para dizer coisas duras. Foi atrás de terras distantes que o atraíam e, muitas vezes, pegou no sono onde lhe parecia seguro e confortável. Porém, acordava sempre com a sensação de que precisava partir. Sentiu medo, pavor, quando a mulher que dormia ao seu lado o beijou e partiu sem ao menos dizer adeus. Sabia que a fatalidade estava por vir. Ninguém escapa do espasmo desconfortável dos adeuses.

Há tempo para tudo. Para encontros e despedidas. Para um beijo inteiro ou um beijo partido. Para a poesia e para a prosa. Para amores presentes e futuros amantes. Para a felicidade e para a tristeza. Para a razão e para a incerteza. Para o sonhar e para ter o sonho desfeito. Tempos para se achar e para se perder pelos caminhos. Para começo e fim de romance. Tempo para o engano e para o desengano.
Mas sempre resta a lembrança dos carinhos sem fim. E como canta o maestro Tom Jobim, em uma de suas músicas: “É preciso dizer adeus”.


Daniel Rubens Prado,
Verão de 2007.
Chove e faz sol.
Clique nas músicas para ouví-las.

terça-feira, 13 de fevereiro de 2007


Morre o Homem, fica a fama?

Diante das recentes notícias que invadiram nosso cotidiano, sobre os problemas acerca do aquecimento global e seus possíveis desfechos, coloco-me na pele daqueles que pensam e se preocupam sobre como serão lembrados depois que a carne de seus corpos apodrecerem, exibindo a caveira com a mandíbula escancarada – a caveira que um dia exibia um sorriso largo e satisfeito; e as órbitas vazias onde os olhos, altivos e orgulhosos, lançavam raios de superioridade sobre os pobres miseráveis indignos de compaixão. E penso sobre como tais reis as recebem, as digerem; na náusea que contamina seus estômagos - suco gástrico subido à língua -, quando observam a possibilidade da morte, de sua morte, a de seu mundo, a de todos.

Penso também naqueles pobres homens que fazem de sua riqueza artifício único para justificar sua existência. E naqueles criativos seres que se acham imortais somente pelo fato de serem reconhecidos por todos, pelo mundo inteiro, seja lá qual for o motivo. Na maioria das vezes, o pior possível. Eles imaginam suas ausências supridas por um nome numa estrela dourada pregada no chão. Inflam-se de orgulho e trabalham incessantemente para serem celebrados por seus feitos extraordinários. Por todo sempre, eternamente.

Morre o homem, fica a fama?
O ser humano, contemporâneo desse medo terrível, pior ainda do que aquele outro - sim, o da própria morte -, encontrará conforto para a alma depois da notícia aterradora de que não será lembrado por ninguém, assim como aquele mendigo do banco da praça ou aquele malandro perambulando pelas ruas atrás de cachaça? Por quê? Fácil. Não sobrará ninguém para apontar seu retrato na parede, dizendo: “Olha, filho. Ali está seu parente, pessoa que nos deixa orgulhosos por compartilhar seu sobrenome conosco”.

Quem sabe tal notícia os cure, enfim, dessa cegueira anunciada há tanto tempo. E, na intensidade de suas angústias, os desperte para uma nova vida, a única vida, a vida deles - com começo, meio e fim. E, que dessa maneira, saiam pelas ruas como quem caminha pelas trilhas do passado, buscando concertar toda cagada que fizeram e que, somente agora, recente nos seus narizes, antes entupidos pelo próprio ego.


Fred Tonucci.
Foto: Empty frame,
By Andross.

quinta-feira, 8 de fevereiro de 2007





Nossa poesia é livre.
Por exemplo,
A triste sustenta nossa alegria,
Enquanto a eufórica nos escurece.

Versos não são presos ao fim do dia.

Amanhecem!


Daniel Rubens Prado
Imagem: Tahoe Sunrise,
By Robert Lweis.

quarta-feira, 7 de fevereiro de 2007


O náufrago

Avenida Amazonas. Primeiro quarteirão.
O homem se curvou diante de uma das palmeiras, fechou os olhos e deu a primeira golfada.
Eu, com o café quente em punho e uma ressaca daquelas, observava de longe todo aquele mal-estar. Os transeuntes não o viam. Nem olhavam.
Ele começou. Vômito. Vômito atrás de vômito.
Ali, no centro da cidade, mais um ser naufragado em suas desilusões.
Busquei um copo de água bem gelada e me aproximei.
Ele me encarou.
Seus olhos lacrimejavam. Ofereci-lhe o copo. Ele aceitou. Deu um gole fundo. E me disse, com um jeito de pesar:
- Estava no INSS. Minha senha é 353. Não agüentei esperar.
Perguntei se queria que eu chamasse uma ambulância. Disse que não precisava:
- Vou ligar para o meu filho. Ele virá me buscar.
Desejei sorte e voltei para o ar condicionado da repartição pública onde trabalho.
A vida continuou.
Lá fora.

Daniel Rubens Prado,
Verão de 2007.



Imagem: Tirada do site www.fotosearch.com
Autor desconhecido.

terça-feira, 6 de fevereiro de 2007


As meninas do terraço


As meninas do terraço se divertem. Julia, Lúcia e uma amiga brincam de esconde-esconde. Porém, na brincadeira de esconder, as meninas contam até dez. No meu tempo de brincar, na minha infância interiorana na cidade grande, que nem era tão grande assim, contávamos até cem. Volta e meia até estendíamos um pouco, para dificultar a procura.
No alto do prédio vejo as meninas que brincam cercadas entre as linhas estreitas que percorrem os ponteiros. O tempo é escasso. Há pouca liberdade para os olhinhos pequenos. Mas no entanto, escuto vozes cheias de esperança. Esperança de tempos melhores e livres.
Enquanto escrevo na tela pálida do meu computador, escuto os pequenos passos galopantes e os gritos de extase das três meninotas. Há alegria. A diversão no mundo da imaginação é garantida. Mesmo que daqui, a alguns metros de distância do terraço, um suposto poeta construa uma prosinha em homenagem a pobre infância das menininhas. Pobre de espaço, pobre de tempo.
Um grito de Júlia rompe a monotonia do começo da noite. Talvez tenha encontrado Lúcia e a amiga escondidas no mesmo lugar, em um tempo recorde. Achei aquilo divertido e quase fui lá brincar com elas. Mas provavelmente elas achariam estranho. Além do mais, sou grande demais para caber em qualquer lugar naquele terraço.
Depois, o silêncio tomou conta da noite sem lua. A mãe das garotinhas deve tê-las chamado para a janta. Nada mais divertido que uma sopa de letrinhas depois do esconde-esconde.



Daniel Rubens Prado,
Verão de 2007.

Imagem: Clock end Key,

By Jin Wicked

Mais no http://www.jinwicked.com/art/

segunda-feira, 5 de fevereiro de 2007



POEMA SAÍDO DO ARMÁRIO

Ninguém para me escutar, bem no choro do meu grito mais surdo
Quando saberão de mim, do Outro que ama além, que sonha que ama?
Expulso de casa, sem vergonha e amigos, caminharei com minha mochila
Entre estrelas solitárias, meus amores brilhando ao meu redor
A vida que eu sempre quis, longe das paredes frias dos consultórios
Médicos, parentes, professores, burocratas & policiais me perseguem
Fujo para longe, North Beach, Ilha do Bananal, fossa dos oceanos
Onde me afundo em prazeres ocultos e profundamente adormecidos
Meus poemas escondidos, já serão então lidos por cada garoto medroso?
Cada cu tremendo de pavor na paralisia das horas do genocídio do amor?
Bocas mordendo lábios nos banheiros abandonados do Parque Municipal?
Enquanto isso somente a tristeza das minhas linhas, nenhuma platéia
Para minha auto-análise e exorcismo público ao som da macumba
Nenhum orelha limpa e ombros amigos pra desperdiçar meus segredos
Fujo então, na minha solidão deliciosa dos sonhos despedaçados
Pelo despertador do sol – maldito monstro que persegue os boêmios
Escuto Cazuza, converso com amigos amados que nunca saberão de nada
Até minha morte trágica, vislumbro o funeral, quem estará lá?
E então meus versos confessos serão lidos, veado desgalhado
O caixão baixará entre rumores e fofocas – estarei me deliciando
Acariciando coxas dos Anjos do Paraíso, fumando tudo em PassárgadaE rindo com fôlego do olhar de espanto das madames e seus cachorrinhos!

Jon Tonucci

imagem:

Stars Falls, Alexander Lyamkin

oil, canvas panel

sábado, 3 de fevereiro de 2007



DA MORTE DA PARTE DE TODOS


Vai, Narciso!
Vai...
Senta-te em teu trono
De vaidades
Enxerga o outro
Pelo ângulo do teu umbigo...

... E fica imóvel:
- Espelho fixo
E admira
- Espelho mente
Tua estética
- Espelho demente
Perfeita solidão

Até que um dia
A Morte chega
Também solitária
Porém discreta:

Vulto preto
- Espelho não enxerga
E aí...
Só restará de tua beleza
O mesmo cheiro de toda carne
Podre:
- Espelho quebra


Poesia: Valéria Prochnow.
Imagem: Broken Mirror,
Deb Stoner.

Mais em www.absolutearts.com.

sexta-feira, 2 de fevereiro de 2007




Amor Platrônico


Levantou-se logo cedo e se instalou à frente do computador. Tinha os olhos latejantes e o coração cheio de saudade. Às sete da matina começavam a surgir os primeiros contatos. Observava atentamente cada janela que subia do canto direito, em baixo. Sua alma gelava a cada coincidência gráfica, mas não era a vez – nunca foi, talvez. O nome que esperava adormecia em vermelho. Ela o acariciava qual acalanto, mas seu desejo era despertá-lo, cuidadosamente, para lhe dizer o quão bonito estava o dia. Sentia-se bem assim, na falsa intimidade nostálgica do sono da manhã.
Sentia fome, já passava do meio-dia. E nada, nada. Foi até a cozinha, abriu a geladeira e retirou o prato frio que recusara na noite anterior. Deu duas garfadas e engasgou quando ouviu o sinal sonoro de alguém que a chamava – Era só uma amiga. Não respondeu. Guardou o prato novamente e voltou a esperar, sempre com os olhos fixos naquele ícone rubro. Pensava no que ele poderia estar fazendo. E se ele só existisse quando estava on-line?
Exatamente às cinco horas e quarenta e três minutos ele apareceu. O coraçãozinho dela disparou, suas mãos suavam. Ajeitou seu corpinho na cadeira, massageou o rosto e arrumou rapidamente o cabelo. Abriu a caixa de diálogo, mas sabia que não teria coragem de escrever. Para ela bastava contemplar a foto estampada na tela. Era como se ele estivesse na sua frente, vivo. De repente gargalhou quando leu o que ele escreveu na frente do nome. – Que legal, ele está de bom humor hoje! Disse ela, radiante. Achava que o conhecia mais do que ninguém.
De súbito, sentiu uma coisa estranha por dentro. Aquilo não era normal. Uma coragem sem tamanho tomou conta de sua alma. Decidiu que naquele dia era falaria tudo que estava guardado há tanto tempo. Não sabia por onde começar. Com as mãos espalmadas no teclado, ela pensava nas primeiras palavras. Com os olhos grudados nas teclas que ela escolhia com tanto carinho, digitou uma linda frase. Titubeou alguns segundos antes de teclar enter.
Quando ergueu a cabeça para conferir a reação de seu amado ele ali já não estava. Tudo aquilo que escrevera agora não passava de palavras pregadas em uma tela fria. Consternada, enxugou a única lágrima escorrida do seu olho. Sentiu certa raiva. Mas logo se acalmou e se afundou novamente na cadeira. O tempo não é problema para ela.



Texto: Fred Tonucci.