terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

O AMOR NOS TEMPOS DA OBRA

Fecho os olhos, respiro fundo e, antes que a noite termine, desço a escadaria da Obra para umas saideiras. Nas pickups, ritmos clássicos de funk, soul e rock embalam os que resistem na boemia. Nessa hora, a sexta-feira 13 de lua cheia já se transformou em sábado 14. E o relógio tenta, vez ou outra, anunciar o sol, que não tarda. Mas, não tão longe daqui, debaixo desta terra, aonde não chegam nunca, os seres diurnos dormem seus sonos de pedra, sonham castelos de areia, almejam os sóis das manhãs. E nós, sem notícia concreta do dia, continuamos eternamente em obra, dançando, bebendo e flertando.

Entre uma cerveja e outra, eis que, de repente, diante dos meus olhos e da embriaguez dos desejos, surge de blusa verde e sorriso farto a mulher mais suave que se tem notícia. Com a súbita aparição, perco o foco de todas as outras coisas noturnas e me atento apenas em seus sorrisos e movimentos.

Com humildade e assombro, balbucio algumas palavras sem tantas esperanças. Embaixo do ventilador, sob a brisa mecânica que promove encontros inusitados, eu a percebo lindamente miúda, derramando simpatia sem esforço. Assim como eu, a bela tenta se refrescar no bom inferno dançante.


Entre várias palavras e alguns afagos, fico sabendo sua procedência. A doce ninfa que flana na madrugada insone mora no bairro Prado. Porém, anunciando sua precoce partida, me diz que precisa descansar para retomar seus estudos na manhã de sábado. Tento, inutilmente, antes de acompanhá-la à porta, arrumar seus cabelos que pendem sobre os olhos. Mas, em um movimento desajeitado, volto a colocá-los sobre sua vista, ganhando mais um sorriso lindo e inesperado.

De leves e despretensiosos carinhos a alguns chamegos que precedem o beijo, me despeço sem que meus lábios toquem os seus, deixando-a em um táxi pálido no fim da noite. Sua ausência se torna adorável e, agora, me conduz de volta para casa pelos mais doces caminhos.

Mais tarde, acordo sob os encantos de uma leveza estranha. Mesmo com a ressaca que me envolve, abro os olhos e a primeira coisa que penso é na imagem e na leveza daquela mulher Obra. Senhorita de uma beleza maravilhosamente simples, dela guardo o nome, o telefone e a esperança de outros encontros. Ou devaneios.



14 comentários:

Adriana Godoy disse...

Buda, grande texto, doce, poético, intenso. Mui belo. As imagens vão se formando à medida que o lemos, de uma maneira suave e forte. Beijo.

Anônimo disse...

lugar de encontros e despedidas
momentos para guardar
outros para tentar esquecer

não é a primeira vez que momentos são narrados aqui. lembro do post "depois daquele baile" e guardo aquela noite especial


http://projetoeutanasia.blogspot.com/2007/08/depois-daquele-baile.html#links

Anônimo disse...

kkkkkkkk! o melhor título de todos!
amo sua leveza, my dear!

Anônimo disse...

São tantos os meus amores no tempo da Obra...

Anônimo disse...

Show crazy!

Isa Discacciati disse...

Linda,linda sua poesia.
Lindos estes encontros da vida.
Boa sua visita.
Um abraço

Anônimo disse...

encantadora a sua forma de descrever os acontecimentos da noite!
"um beijo secreto no portão"

Anônimo disse...

A poesia da noite
a poética boemia
o eterno charme de Daniel Prado...

Unknown disse...

Que saudade que me deu da Obra!! E de vc, meu Budinha...eu to derretendo de saudades, te amo muito meu lindo!!

Gabriel Cadete disse...

puxa, que ótimo o texto!

Alfredo Souza disse...

Curti bastante!

Anônimo disse...

A noite do poeta...
Ou o poeta da noite???

João Tonucci disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
João Tonucci disse...

Caro Poeta, um belo texto! cheio de evocações noctívagas. Cada vez mais certo que só mesmo a noite para revelar esses anjos deliciosos - guarde-a com amor nos seus passos.