quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Primavera


As manhãs geralmente não me parecem tão belas como aquela me parecera. Havia no ar uma sensação de tranquilidade, as pessoas pelas ruas pareciam mais felizes e amáveis, embora não houvesse dúvidas de que absolutamente nada de diferente se destacava em seus rostos e em seus sorrisos. Sentia também um forte e agradável perfume sem origem, como se alguém tivera acendido gigantescos incensos de lavanda esquina após esquina. O sol iluminava a cidade e nos esquentava na exata necessidade de nossos corpos. Uma canção de Vivaldi, que somente eu parecia escutar e da qual não me recordo o nome, ampliava minha satisfação em caminhar por entre aquela gente.

E foi justamente caminhando por uma daquelas ruas que uma jovenzinha distraída foi prensada entre uma kombi escolar 1980 e um Citroën 2010-2011, com pintura cinza fosca, rodas de liga leve e elegantes detalhes em dourado nas portas e pára-brisas. Os motoristas não tentaram fugir, dezenas de ensandecidas pessoas começaram a sair de suas casas em direção à jovem e eu, que a tudo presenciei, continuava a achar a manhã muito bela e as pessoas mais felizes e amáveis, embora não houvesse dúvidas de que absolutamente nada de agradável se destacava em seus rostos atemorizados.

Texto: Frederico Alberti.
Imagem: Roy Lichtenstein.

3 comentários:

Anônimo disse...

Muito bom... bem (-) vindo!

Fred Tonucci

Adriana Godoy disse...

Interessante, prende pelo inusitado.

Anônimo disse...

Eu sei, seu estilo sempre.