terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Eu perdi a palavra e o mundo me escapa


Porque era assim. Era assim que eu costumava agarrar o mundo. A escrita faz tudo violentamente mais bonito, e eu fazia. Eu me reconhecia pelo que me traduzia. Pela poesia que a vida me dava, mesmo quando não dava. Mesmo quando não tinha. Porque quando a palavra saía fácil, eu durava no tempo. No mais inverossímil espaço de tempo. Mesmo falando da minha finitude, do meu amor, do meu desejo pelo outro (meu leitmotiv). A palavra me fazia igual ao desejo, insistente, permanente, ruidosa, própria. Agora sou lúcida, palavra que detesto. Não quero. Quero a irrealidade, quero a ilusão inconformada, quero o deleite de escrever como se não houvesse tempo, prazo, meta. Quero o prazer de escrever pra você como se não tivesse perdido um pouquinho de coração no caminho. Porque me falta a palavra, sofro compreendendo o que nunca precisei entender, choro pensando no amor que me falta e no amor que me excede. Eu já fiz sofrer tanto e reconheço a dor. Porque já sofri tanto. Mas ainda assim – e por isso - eu escrevia meus álibis. E meus cúmplices.

As coisas infinitas também morrem. Mas disso eu já sabia.

Texto: Sílvia Michelle.
Imagem: Shut up, por Tiago Ribeiro.

7 comentários:

Unknown disse...

nossa silvia, que estranho... até parece que fui eu que escrevi isso! hehehehe! me identifiquei tanto, tanto, que acho que a gente seria super amiga! hahaha

bem-vinda ao eutanásia! adorei, continue nos presenteando com seus textos!

João Tonucci disse...

belo texto! que fôlego das palavras, transbordam de poesia pura, de sufoco. e que fechamento: "as coisas infinitas também morrem". escreva mais, pro nosso deleite.

Ricardo cateb disse...

Porque era assim, profunda!
Mas disso eu já sabia, Silvita!

Projeto Eutanásia disse...

Poeta, poeta...
Que maravilha!
Sou completamente alucinado pelas suas palavras, pelos seus devaneios.
Você não imagina a minha alegria em tê-la como cúmplice nas páginas negras
Não se esqueça: o Projeto Eutanásia é a sua casa. Ou melhor, o seu lar.
Beijos, alegrias e poesias.
Com afeto,
Do fã incondicional,
Daniel Rubens Prado.

Sil disse...

Amigos,

melhor acolhida eu não poderia ter! Que alegria pode fazer parte desse projeto, dessa casa linda, que já sinto como minha. Venho de coração aberto ao encontro desse novo lar.

Beijos e sorrisos,

Sil.

Luciana Andrade disse...

Belíssimo texto, Sílvia! A identificação é imediata! Para nós, que vivemos do encantamento das palavras, escrever é uma mistura letárgica entre o espanto e o sublime! Parabéns por descrever tão bem essa relação! Um grande beijos!

Anônimo disse...

Porque é assim...
Um jeito só assim de gostar
Da palavra. Mesmo perdida.
Porque é assim, poeta!
Um jeito único de amar pra sempre a palavra que escapa
E, claro (ou escuro), a dona dela
Que já sabia.

Que cúmplice!
Quanta alegria...

Beijos,

Dani.