segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

Minha música

Cheguei ao Marilton's no fim da tarde. Ainda sozinho, disse sim à garçonete, muito simpática por sinal, e bebi o primeiro, dos incontáveis goles da noite. O bar é um dos melhores do Alto dos Piolhos: tira-gosto para todos os gostos e cerveja sempre bem gelada. Tem até iscas de tilápia de água salgada. Perfeito.

Serginho Oly fazia seu som, acompanhado de uma ótima percussionista, porém, me pareceu, ainda jovem no pedaço. Conversei, comigo mesmo, sem parar. Parecia triste, alguma solidão. Nada certo. Trabalho, família, casa, tudo ok. Aí pensei nos amigos, e entalei.

A Luisa chegou depois de uma hora. Desentalei. Falamos, fumamos e a coisa me pareceu mais simples. Eu estava desenhando monstros em minha cabeça, quando na verdade tratava-se apenas de uns poucos cães famintos. Maravilha.

De repente, Augusto me aparece, para matar minha saudade. Ele está maior, eu juro. Talvez maturidade, talvez trabalho demais, talvez raça demais. Conversamos muito; o mar não está para peixe, digo, focas, digo jornalistas. Passaram por lá outras pessoas: Paula, Joana, Anemia e Izabella, Aline. Mas foi tudo rápido demais. De um boêmio falastrão para uma mesa cheia de vida, em minutos. É, eu não tinha do que reclamar. Finalizamos com um feijão lá em casa. Nada melhor para dormir bem, em tentativa de diminuir a ressaca do dia seguinte.

Mas uma coisa ficou na memória. Não sei bem o quê, talvez o cheiro do crepúsculo, anunciando a lua no Santa Tereza.


Enquanto estava sozinho, escrevi essas bobagens:

Minha música


Eu tenho meu samba
Com todas as notas tristes
Com todo amor e dor

Em meu jazz enxergo o caos
O frio e tortuoso caos
que me leva pra longe, sem rumo

Choro e canto um blues
Nas noites molhadas
de chuva e lágrima

Mas é para ele que dou
Todo calor e fúria
que se encontra em mim

é ao rock, baby, que digo 'sim'.






Texto, poesia e imagens do Alto dos Piolhos : Bruno Sales.

quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

Da raridade do habitual

“Vem cá, Valéria. Vem ver pássaro raro, outro, aqui em nosso quintal”.

Meu pai, conhecedor das coisas da terra, habituou-se a esse ritual: sempre me convida a um encontro novo. Ele, dono de pouca fala, sente ao fundo isso de ser das Minas. Nascido num interior que ainda hoje conserva o cenário "igreja, praça, ruas de terra", viveu em roçado e inda vive, o roçado, dentro de seu grande, mágico e musical coração.

Passarim de hoje tem nome de ‘rebita-rabo’. E é uma graça, o danado. Anda como se aos pulinhos, ágil e matreiro, e de quando em quando, levanta o rabo, um rabo eriço, fino e certeiro, em direção ao céu. Uma flecha sem ponteira, lépida e arteira, num sobe e desce infinito e brincalhão.

Rebita-rabo anda em passinhos apressados pelo quintal enquanto vejo meu pai. Os olhos dele: acompanho alumbrada.

Crescida em cidade grande, tenho nele a necessária dose pros desejos de alma sertaneja e interiorana que m’habita desde sempre.

E hoje, bebi em seu cálice de barro mais uma dessas largas porções: alimento pra uma vida toda: logo a manhã firmou no céu, Passarim pisou nosso quintal. “Não sabia que gostava de jabuticabas”, disse, encostadim na porta que dá pros verdes da casa. Chegamos perto, numa delicadeza de bailarinos, em ponta dos pés, e eram três! Alvorotados, fazedores de festa no café-da-manhã. “Logo, logo eles voam embora. Esse joão-de-barro, aquele, vê? Pensa, o moleque, que é rei. Afugenta tudo que voa, que rasteja, que arredonda por aqui. Mas é esperto, e raro, o rebita-rabo. Eles voltam. Amanhã, pode botar reparo: eles voltam e em bando. Engraçado, vê que eles gostam mesmo de jabuticabas?”.


Texto: Val Prochnow.
Imagem: Autor desconhecido.

sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

Imagem: Birthday, por Delilah Smith.

O Projeto Eutanásia completa, neste janeiro instável, um ano de vida. Agradecemos a todos nossos colaboradores e leitores por fazerem deste espaço virtual um mundo de entrega e lirismo.

VIDA LONGA AO PROJETO EUTANÁSIA!


quinta-feira, 3 de janeiro de 2008



Dou uma flor como quem diz: "seremos eternos".
Ofereço-te lágrimas, suspiros e abraços comoventes.
Dou amor, calor, colo.

Mas é apenas uma flor, no meio de tantas.
No meio de tantos tristes, tanta impotência
Dou amor, calor, colo.

Não, meu bem, não é apenas uma flor.
Tua beleza não esconde teu fim:
Deixar bela a ponte da vida.
E dar amor, calor e colo.




Bruno Sales (ou melhor "Nolo"),
para Daniel Rubens Prado (ou melhor "Dota").
Imagem: Dota.