terça-feira, 26 de junho de 2007

A garota do ônibus


Segunda-feira carregada de náuseas. Aquelas cervejas e pingas, com meia-dúzia de frangos a passarinho no estômago, garantiram mais uma segundinha daquelas. Além de assistir meu time perder, perdi o chorinho de domingo e preferi sonhar com finais de semana melhores.
Apenas 20 minutos atrasado, cheguei ao serviço pouco disposto. Passei o dia resolvendo pequenas pendências, sem dispensar o mal-estar. Ao meio-dia, estava de prontidão para bater meu ponto e ir correndo em direção ao outro ponto, o de ônibus. Lento, esperei 15 minutos cravados pelo 9106. Quando ele chegou, procurei um assento ventilado. Nada melhor que um ventinho gelado, para dar sensação de cura. Na minha frente, de moletom rosa, uma garota de cabelos repicados e jeitinho moleque. Ainda não havia reparado seu rosto, mas já o imaginava de uma beleza de doer.
Durante o percurso, prestei bastante atenção em seus movimentos. As mãos iam constantemente à cabeça, mostrando-se preocupada com algo. Eram mãos finas, de uma delicadeza ímpar. Parecia que ainda guardava algum sonho de menina. Volta e meia, virava para ver o mundo lá fora e conseguia vê-la de perfil. "Que beleza de garota", pensei, sem muito alarde.
Depois que já havia decorado quase toda a ternura de seus movimentos, comecei a pensar em que ponto ela desceria. O primeiro que me veio à cabeça, foi um ponto no Sion, onde já vi descer algumas das garotas mais interessantes desse meu Belo Horizonte. Mas o ônibus passou e ela sequer mexeu. Outras duas hipóteses foram os pontos que ficam na Praça Alaska e na Avenida dos Bandeirantes. Entre os dois, que ela não desceu, notei uma semelhança dela com A Garota da Ponte, protagonista do filme homônimo, vivida pela atriz Vanessa Paradis, que assisti há alguns anos, e me apaixonei. (Pelo filme de Patrice Leconte, também conhecido como A Mulher e o Atirador de Facas e pela garota da ponte, que na vida real é casada com o ator Johnny Depp).
Inquietação. A garota do ônibus não parou de mexer com as mãos. Brincava com os dedos, mexia no cabelo e, em um desses movimentos, exibiu toda a nudez de sua nuca. Essa sim devia ser uma das novas sete maravilhas do mundo, assim como o Redentor, com todo respeito ao maravilhoso Estado da Guanabara.
Por um instante, pensei que ela desceria no mesmo ponto que eu. Por um momento, pensei em dizer para ela sobre sua semelhança com A Garota da Ponte. Se não houvesse assistido ao filme, pelo menos a instigaria a fazê-lo. Mas, um ponto antes do meu, já no charme do bairro Serra, ela dá sinal. Sem olhar para este humilde escriba, desce do ônibus, coloca seu cachecol azul e sai andando. Deus sabe lá para onde. Quem sabe para a ponte?

Daniel Rubens Prado,
Inverno de 2007.
Cheira inverno, mas não faz tanto frio.


3 comentários:

Anônimo disse...

Alguém me empresta uma imagem de coração beeeem linda pra eu colocar no lugar de palavras aqui nesse comentário?

Rebecca M. disse...

Volta e meia também me apaixono por pessoas no meio da rua...

E agora estou me apaixonando pelas suas crônicas!

Adriana Godoy disse...

Bom, cara. Bom mesmo. O Buda escritor. Tô gostando disso, de verdade. Bj. Dri