Ela não entendia os limites da pele e então tudo era mistura. As cores da cidade o barulho da cidade a dor do homem debaixo do viaduto os odores todos as alegrias e ansiedades eram e são ela. Era como se não houvesse fronteira era tudo encaixado na mesma massa no mesmo espaço. Ela era a rua a rua entrava nela e juntas eram uma coisa outra e a mesma coisa.
Tinha sempre a sensação de que era meio fora de foco para o outro, aquele que nunca é estranho - já que a compõe. É parte e não pertence. Ela é o outro e esse nem faz ideia.
Se fixasse bem o olhar no espelho percebia facilmente as linhas de vários tons que se esforçavam para dar-lhe um rosto. Os olhos envoltos por linhas azuladas pretas marrons e brancas emaranhavam-se para definir os cílios as pálpebras móveis as íris as olheiras. Era costura trabalhada ponto pós ponto na esperança de constituir alguma distância por menor que fosse do que ela supunha ser externo.
Ela sempre sentiu-se como um rascunho de si mesma.
Texto: Val Prochnow.
Imagem: Autor desconhecido.
Imagem: Autor desconhecido.
3 comentários:
Bom texto, Val. Serolístico!
Ou "ser holístico". Mas tudo junto faz muito mais efeito, imagino... ;)
Valeu, querido, Ewerton!
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