Querida Anita,
Hoje é dia 10 de março e estou em uma cidadezinha do interior, chamada Jeceaba. O trabalho do papai tem dessas coisas: tem dia que preciso viajar. Vou, trabalho e volto. Resolvi escrever esta carta para você, pois uma coisa estranha me aconteceu: você ainda não nasceu e, só por estar longe da barriga que lhe acolhe, estou morrendo de saudades.
É engraçado, sabe, minha filha? Eu ainda não te vi ao vivo. Só por umas imagens muito erráticas e nebulosas de um aparelho que se chama ultrassom. Ele consegue, por cima da pele da barriga da mamãe, filmar você lá dentro. Mas não dá para ver muita coisa. Só uns vultos que desenham sua silhueta.
Eu ainda não senti seu cheiro. Não sei a cor do seu cabelo. Não sei se você é tímida, se tem uma pinta, se faz charminho, ou se joga duro. Ainda, meu amor, nunca te encarei nos olhos. Mas tenho a certeza de que, quando este momento chegar, será o mais belo da minha vida.
Eu ainda não te ensinei nada. Nunca falei para você deixar de fazer isso ou aquilo, tomar o caminho tal, usar a cor assim, comer assado, falar mais alto ou mais baixo, conforme a ocasião. Nunca escutei, meu amor, a sua voz. Nem o seu choro. E mesmo assim bateu uma saudade enorme de você, aqui, dentro de mim, no coração do papai. Que coisa maluca, não é mesmo?
Mas acho que imagino por que: você já mora comigo. Na minha casa, meu amor, moramos felizes, eu, você e a mamãe. Eu, minha Anita querida, já converso com você, diariamente. Já cantei para você, já brinquei com você. Já acordei com seus chutes, já pensei que eles me respondiam. Já sorri e chorei por sua causa. Meu amor, eu já fiz o seu quarto, já pensei em sua rotina ao nosso lado, em nossa casa. Você já tem várias roupinhas, sabia? Já tem até música!
Anita, já tem tempo que te amo. E que penso, dia após dia, em fazer de você uma pessoa feliz. Quanta saudade me atormenta agora!
Do seu papi,
Bruno.
Dois meses antes de você nascer.
Texto: Bruno Sales.
Imagem: Ultrassom de Anita.