“Mas há a vida que é para ser intensamente vivida,
há o amor.
Há o amor. Que tem que ser vivido até a última gota.
Sem nenhum medo. Não mata.”
Clarice Lispector
Há a vida. E por acreditar ser uma só, era a tentativa dela de experimentar mais uma vez o furor. Há tempos a doçura havia tornado tudo mais calmo.
Há o amor. Os beijos ternos, o olhar profundo, a razão por dias mais serenos. Menos solidão, o sono aconchegado, todo um cuidado.
Tudo o que ela desejou durante toda a vida estava ali, ao lado. Bastava um erguer dos braços e teria o abraço. O que sempre esperou.
Mas, há a paixão. E, tomado por uma súbita revolta em ver que ela poderia não ser mais sua, perdeu-se, e com ele o sentido. As mulheres tantas, a vida desregrada, a facilidade em beijar flores. Nada disso importava mais. O sentimento fulminante, a carne viva; o corpo em estado de tensão, esperando o momento de explodir em ações e insensatez. Quedas de hormônios na corrente sanguínea. O sangue irrigando tudo, o rosto ruborizando. Vermelho é a cor. Paixão. E vicia. Lisérgica? As cores parecem ficar mais vivas, as palavras começam a tecer poesias, a música não pára de cantar. A vida parece que nunca vai acabar. A figura se geometricando em três lados, cada um escondendo verdades que ninguém quer. A mentira, a possessividade, o ego, a luxúria, a carência. Tudo sendo mascarado pelas declarações bonitas de um sentimento que passaria tão rápido quanto o efeito de outra droga qualquer. Abrindo fissuras no coração. Dificilmente serão cobertas.
Ela se confunde e se apaixona. Ele se perde em suas próprias esperanças. Talvez, de um dia ter alguma certeza. Os dois em pouco tempo se iludem e vão.
Ela volta pro amor. Ele para as flores. Dor, inevitável elixir de quem escolhe viver.
Ana Flávia Rodrigues,
– Setembro de 2007.
Imagem: The Butterfly,
por Monica Shelton.