sexta-feira, 21 de junho de 2013

Poema sem título (ou seria poema sem vergonha?)


POEMA SEM AR
 

Eu disse que precisava partir
e que nada é assim
tão preciso, tão ruim
mas que precisava ir.
 
Eu me apaixonei por outra.
Fiquei mudo - perdi
o sono, o tino, o rumo;
quase larguei tudo.
 
Pela amiga, eu fui atropelado.
Concebida a imprevisibilidade,
o momento de descuido,
o espanto, o espasmo,
acaso dos acasos
neste caso, talvez, de amor.
 
O amor é entregue,
coisa linda, leve,
de quem sabe que a vida,
muito mais que louca,
é breve.
 
 
 
Poesia: Daniel Rubens Prado.
Imagem:Jib Peter.


quinta-feira, 16 de maio de 2013

Clichê or not clichê


Um emaranhado de pequenos fracassos que triunfam em cima da sua esperança de amor.
Você escreve os melhores versos sofrendo as maiores desilusões. Você separa a garrafa de vinho, o papel em branco, derrama algumas lágrimas para compor o cenário e verte as palavras certeiras, a agonia presa no seu coração combalido. Os amores perdidos te ajudam a abrir os olhos pelas manhãs porque te lembram que uma nova linha pode ser escrita. Todas as paixões destruídas te fazem sentar naquele mesmo bar, pedir aquela mesma cerveja, naquele mesmo copo - e lembrar daqueles tantos colos, belchior - e rabiscar no guardanapo o poema que faltava. Todos os sonhos escurecidos pela madrugada solitária nos fazem companhia diante das teclas furiosas que ensaiam uma nova página. O duro golpe do desamor é o que nos move, o que nos faz pisar na esperança para depois vê-la ressurgir numa esquina do centro, num pastel de rua, numa marca de batom. Tantas pancadas do amor que, quando ele nos afaga, perdemos os versos, não sabemos mais que palavra usar. Tantas rasteiras da incerteza, tanta falta de coragem, que a inspiração vem da tentativa de capturar esse outro que nos escapa a todo o tempo. Tanto poderia ter sido, que a porrada de ser bate tão forte que nos derruba. E do chão jorra a palavra.
E o que eu queria dizer - e nem sei se disse - é que é mais difícil falar de amor amando.

quarta-feira, 10 de abril de 2013

Nosso carnaval

 
Do escuro da casa de dança, sua voz calma, como se
fosse luz, brilhou tanto que ofuscou a multidão e
congelou o tempo. Arteiro, certeiro, suas palavras
sempre exatas e sua mão, quando dada à minha,
parecem interromper o movimento do meu caminho
corda bamba, melhorando minha passada, minha
viagem, apaziguando parte de minh'alma que anda
penada, mas atordoando o meu peito, que de novo
bate, urgentemente, no compasso desse nosso
carnaval.
 
 
 

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

O POETA, O VIOLÃO E A PATERNIDADE

 
No caminho para mais uma reunião, o trânsito era intenso na Lagoa Rodrigo de Freitas. Que sorte. Com isso, pude perceber o cartaz que anunciava o show, a ser realizado naquela mesma data.

Entre uma viagem e outra, era mesmo muita coincidência estar na cidade na mesma noite em que o mestre Toquinho se apresentaria, com apenas um banquinho e um violão.

Já havia tido o privilégio de acompanhar um dos seus shows, na boníssima companhia de verdadeiros irmãos. Como se não bastassem as letras e melodias imortais que aprendemos a apreciar, literalmente, desde a infância, Toquinho ainda irradia uma simpatia aconchegante e conta, descontraído, casos antológicos por trás de cada composição que se segue durante o espetáculo. Assim, dessa vez, fiz questão de ir cumprimentá-lo após o show.

Entre breves palavras, acompanhado da minha irmã, tive a oportunidade de dizer ao mestre que apenas recentemente conheci uma de suas composições com Vinícius: O Filho Que Eu Quero Ter.

Disse a ele que, com a minha esposa grávida da nossa primeira filha, deparei-me, pela primeira vez, com essa música. Admirado, busquei o texto. Acompanhei as letras junto com a música até que, no meio da canção, já não conseguia mais ler, pois as lágrimas ofuscavam-me a vista.

Toquinho, então, contou-me que, certa feita, entrou no quarto de Vinícius e deparou-se com o poeta muito emocionado, aos prantos sobre sua mesa de leitura. Ele havia acabado de finalizar as letras para O Filho Que Eu Quero Ter.

Na presença do mestre, senti meus olhos novamente se enchendo d`água.

Garanto que não apenas os hormônios maternos são alterados pela maravilhosa sensação da gravidez. Os paternos também.
 
 
Texto: Leonardo Ladeira.
Escute a música aqui.




O FILHO QUE EU QUERO TER
 
É comum a gente sonhar, eu sei
Quando vem o entardecer
Pois eu também dei de sonhar
Um sonho lindo de morrer
Vejo um berço e nele eu me debruçar
Com o pranto a me correr
E assim, chorando, acalentar
O filho que eu quero ter
Dorme, meu pequenininho
Dorme que a noite já vem
Teu pai está muito sozinho
De tanto amor que ele tem

De repente o vejo se transformar
Num menino igual a mim
Que vem correndo me beijar
Quando eu chegar lá de onde vim
Um menino sempre a me perguntar
Um porquê que não tem fim
Um filho a quem só queira bem
E a quem só diga que sim
Dorme, menino levado
Dorme que a vida já vem
Teu pai está muito cansado
De tanta dor que ele tem

Quando a vida enfim me quiser levar
Pelo tanto que me deu
Sentir-lhe a barba me roçar
No derradeiro beijo seu
E ao sentir também sua mão vedar
Meu olhar dos olhos seus
Ouvir-lhe a voz a me embalar
Num acalanto de adeus
Dorme, meu pai, sem cuidado
Dorme que ao entardecer
Teu filho sonha acordado
Com o filho que ele quer ter

(Vinícius de Moraes e Toquinho)


quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Raro Efeito


 

Para T.C.B.
 
 
Beijo de musa, beijo de música,
choro, samba, encanto,
encanto que ilumina encanto
que em algum canto canta Noel e outros bambas.
 
Floresce ensolarada fascina
noctívaga na ilha
sobe à luz da Lua
louvada seja sempre levada
contida cantiga de amor
docemente embriagada
 
Menina maré, moça distante
desatino no fundo do olhar
verso achado na canção do vento
verso menino poema de amor lançado
poesia engarrafada desce o rio...
 
É Minas em busca do mar.
 
 
Poesia: Daniel Rubens Prado.
Imagem: Sérgio Aguirre.